“Ele colocou as mãos nas
minhas pernas com vontade e foi subindo. Assédio sexual”, diz ex-aluna de
Silvio Almeida; ex-ministro não comenta.
Uma ex-aluna de Silvio
Almeida, ex-ministro dos Direitos Humanos, afirmou à coluna que sofreu assédio
sexual do então professor em 2017, quando estudava direito na Universidade São
Judas, em São Paulo. Almeida foi demitido do governo neste mês, depois de a
coluna revelar que o então ministro é alvo de denúncias de suposto assédio
sexual, inclusive contra a ministra da Igualdade Racial, Anielle Franco.
Inquéritos da Polícia Federal e do Ministério Público do Trabalho apuram as
acusações.
A mulher deu entrevistas à
coluna em duas ocasiões, na quinta-feira (19/9) e na sexta-feira (20/9), sob a
condição de anonimato por temer retaliações. A ex-estudante enviou à coluna
prints de conversas de 2022 nas quais abordou o episódio com outras pessoas.
Também encaminhou conversas que manteve com Almeida no fim de 2016, quando o
então professor de Filosofia do Direito passou a ser seu orientador em um
projeto de iniciação científica, do qual ela disse ter desistido após o suposto
assédio. Por causa da desistência, ela perdeu uma bolsa de estudos referente a
40% da mensalidade.
De acordo com a ex-aluna, o
assédio sexual ocorreu no início de 2017, em um café dentro da faculdade à
noite, período em que ela cursava direito. A ex-aluna e Almeida faziam uma
reunião de trabalho sobre o projeto de iniciação científica, um ao lado do
outro. O café estava cheio, segundo o relato.
“Eu e Silvio Almeida
estávamos no café da São Judas, conversando sobre o projeto de iniciação
científica, quando ele colocou as duas mãos nas minhas pernas, com vontade, e
foi subindo o máximo que conseguiu, enquanto falava normalmente. Eu estava de
saia. Me afastei, fiquei muito aflita. Fui embora, nem assisti à aula naquele
dia e pensei em largar a faculdade”, afirmou a mulher em entrevista.
“Foi assédio sexual. Senti
vergonha, me senti pequena, uma decepção enorme. Foi bem horrível”, disse,
ressaltando que não houve consentimento para os toques. E acrescentou: “Tenho
muito medo do que poderia acontecer se estivéssemos em um ambiente fechado”.
O relato da ex-aluna
referente a 2017 não é a primeira denúncia de suposto assédio sexual por parte
de Silvio Almeida contra estudantes da São Judas. No último dia 16, a coluna
mostrou que uma ex-aluna disse ter sido assediada por Almeida em 2007: “Ele me
puxou e me beijou”. A repórter Laís Martins entrevistou outra ex-aluna, que
relatou ter sofrido assédio em 2009, quando o então professor a telefonava e
insistia para que tivessem um encontro. O repórter Matheus Leitão informou que
estudantes alegaram que Almeida tentava obter favores sexuais em troca de
melhorar a nota das alunas nas provas.
Segundo a ex-estudante, ela
já havia sido alertada por uma amiga sobre os comportamentos inadequados de
Silvio Almeida, especialmente quando o professor cumprimentava alunas. A mulher
contou que, antes desse episódio no café, já havia estranhado um convite de
Almeida para que fosse à casa dele, além de toques não consentidos.
“Em outras vezes, ele já
havia encostado na minha perna, mas eu ficava na dúvida, se era sem querer, se
ele estava gesticulando normalmente ou não. Como ele continuava falando
normalmente durante esses toques, a gente se pergunta se a pessoa vê o que faz.
Era uma conduta muito esquisita.”
Procurado, Silvio Almeida
não respondeu. O espaço segue aberto a eventuais manifestações.
Procurada, a Universidade
São Judas afirmou que apura os relatos de suposto assédio de Silvio Almeida,
que deixou de ser professor na faculdade há cinco anos. Leia a íntegra do
comunicado da São Judas:
“A Universidade São Judas
reforça seu compromisso com a criação de um ambiente seguro, ético e respeitoso
para todos os alunos e colaboradores, repudiando toda e qualquer atitude que
possa caracterizar constrangimento, assédio ou violência. Importante destacar
que, até o momento, a instituição não recebeu nenhuma denúncia ou relato formal
de natureza semelhante aos mencionados, em seus canais oficiais, por isso,
desconhecemos os fatos. Contudo, apesar de não haver qualquer relação jurídica
com o ex-professor há cinco anos, a instituição está apurando internamente o
tema e se coloca à disposição das autoridades competentes para contribuir com o
que for necessário na apuração da verdade dos fatos.”
Comportamento inadequado –
“Beijo no rosto bem molhado”
“Silvio Almeida tinha uma
conduta diferente com as alunas. Cumprimentava com beijo no rosto, bem molhado,
abraçava muito, sempre tentando encostar nos seios. Isso acontecia em qualquer
circunstância, no corredor da faculdade. Não existia nenhum receio da parte
dele em agir dessa forma. Uma amiga minha sempre me alertava dessa conduta
muito inapropriada dele.
Uma vez, ele me ligou e
convidou para ir a um churrasco na casa dele, onde haveria alguns alunos da
Universidade de São Paulo [USP]. Disse que seria algo muito importante para a
minha iniciação científica, o que me colocaria à frente dos colegas na São
Judas. Quando perguntei se poderia levar uma amiga, ele recusou e me deu um
sermão: ‘Olha, você tem que começar a encarar a vida de um jeito diferente. Só
vão ter cabeças pensantes lá, eu seleciono bem o público’. Não fui ao
churrasco.”
Mãos nas pernas sem
consentimento – “Colocou as mãos com vontade”
“Eu e Silvio Almeida
estávamos no café da São Judas, sentados lado a lado, conversando sobre o
projeto de iniciação científica. Ele colocou as duas mãos nas minhas pernas,
com vontade, e foi subindo o máximo que conseguiu, enquanto falava normalmente.
Eu estava de saia. Me afastei, fiquei muito aflita. Fui embora, nem assisti à
aula naquele dia e pensei em largar a faculdade. O café estava cheio, era um
horário bem comercial. Tinha aluno, professor. Não sei se alguém reparou nisso.
As pessoas seguiram comprando seus lanches.
Foi assédio sexual. Eu senti
vergonha, eu me senti pequena, eu não sei explicar, uma decepção enorme. Eu
acho que o maior sentimento foi de decepção, não tenho o que dizer, porque eu
realmente o venerava como professor, como pessoa. Foi bem horrível. Se eu
estivesse em um ambiente fechado, se eu tivesse na casa da pessoa, como seria a
situação? Realmente eu tenho muito, muito medo do que poderia acontecer.
”Impacto psicológico –
“Não gosto que ninguém encoste em mim”
“Por um tempo, realmente não
queria ir mais à faculdade. Quase desisti dos estudos. O episódio também me
trouxe um impacto financeiro, porque desisti da iniciação científica e perdi a
bolsa de 40% da mensalidade que eu havia conquistado. Notei que ficaram alguns
reflexos. Até hoje, não gosto que ninguém encoste em mim. Brigo quando alguém
esbarra em mim na rua. Não gosto mesmo. Por muito tempo, pensei e repensei se
eu tinha feito alguma coisa errada. Será que eu não deveria estar usando saia?
Será que eu sorri demais? Será que venerei demais o professor? Sorri demais?”
Medo de represálias –
“Sentença de morte para o mundo jurídico”
“Não me identifico por causa
do medo de represálias. Denunciar seria assinar uma sentença de morte para o
mundo jurídico. Ele [Silvio Almeida] tinha muita influência em grandes
escritórios de advocacia e entre professores. Estou disposta a prestar
depoimento como testemunha na Polícia Federal, se necessário.
Quando as denúncias contra
Silvio Almeida começaram a vir a público, pensei: ‘Nossa, não sou só eu’. Isso
dá uma coragem para falar. É uma sensação de acolhimento. Pelo menos uma pessoa
vai acreditar em mim, porque ela também passou por isso.”
Por: metropoles.com
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